O Povo Brasileiro é paciente e esperançoso, mas não é frouxo, a despeito das demonstrações de frouxidão de sua liderança executiva, judiciária e parlamentar! Procuram desmerecê-lo, irritá-lo, na certeza de que o faz de idiota. Pobres coitados, àqueles que se empreendem nessa jornada inglória, dificultando-lhe a liberdade ainda que tardia!
Tem sido assim, desde os anos de 1537. Começou na colonização iniciada pelos portugueses, com as subsequentes mazelas praticadas, ao redor do mundo, seguida com a escravização e deportação dos africanos. Havia liberdade, aos primeiros moradores, legítimos donos da terra, perseguidos e eliminados na movimentação conquistadora dos novos entrantes.
A riqueza do solo brasileiro despontou, à flor d’águas, na Capitania caixa-d’água da Colônia mais importante do além-mar. Descobriram-se as muitas preciosidades, abrindo-se os olhos e os interesses gananciosos dos povos poderosos ao domínio daqueles do aquém-mar. Confirmadas as disputas dos bens-sem-donos, proliferaram-se em mil e uns conflitos, em cada quilômetro quadrado existente.
A historiografia brasileira enriqueceu muito, com os preciosos relatos de variados e renomados pesquisadores, de fora e de cá. Neles, encontram-se expostas milhares de páginas sobre as políticas e suas consequentes refregas brasileiras, nunca dantes vistas. Tornaram-se públicos, dalém dos palácios pomposos, engrossando o questionamento: como conter os desmandos politiqueiros e desqualificados, sustentados e endossados pelas lides judiciais descabidas e nada honrosas?
Os desmandos politiqueiros e desqualificados
A quem pertenciam os bens gerados na gratuita natureza, foi a causa inquietadora do sono de muito governante, honesto ou desonesto? A indagação, originada no oriente distante, firmou-se consolidadora de motivos causadores de discórdia entre os homens de variados tempos. Percorreu distâncias inimagináveis, transpôs oceanos, chegou à América Portuguesa.
Aqui, e em outras partes do mundo, ocorreu, no período Setecentista, a movimentação rumo à liberdade. As diversas dificuldades – entre elas, as distâncias, parcas mobilidades e meios de comunicações – foram superadas. Os libertários esperavam, que surgiriam, com certeza, no horizonte, os primevos pigmentos de uma luz grandiosa…
Chegaram, noutras plagas, vitoriosos e radiante… menos aos brasileiros. Na ambicionada e rica terra, vicejavam os desgovernos e as vergonhosas ações gestoras, unidos num propósito ganancioso. Violências hediondas grassaram em muitos cantos do solo pátrio brasileiro, notadamente na Região Sudeste, ao menos em duas épocas distintas.
Nos áureos anos setecentistas, segundos registros historiográficos, ocorreu uma delas, descritos em seguida:
(…)
Abreu Vieira, português natural de Braga e tenente-coronel da cavalaria auxiliar de Minas Novas era, por sua vez, protetor e padrinho da filha ilegítima do alferes Joaquim José da Silva Xavier, comandante do importante destacamento que, no princípio do decênio de 1780, patrulhava a estrada para o Rio de Janeiro, sobre a serra da Mantiqueira – entre Mathias Barbosa e Igreja Nova.[1](56) Silva Xavier, apelidado Tiradentes devido a ocupar-se, secundariamente, de remover dentes e colocar novos feitos de osso, tinha, antes de ingressar na carreira militar em 1775, sido um malsucedido mineiro em Minas Novas. Aspirava unir-se em matrimônio à sobrinha de Oliveira Rolim (…) [2](57) (Maxwell, 1973, p. 164).
Vencidos os tempos, entre disputas inglórias e outras vitoriosas, aproximávamos do segundo milênio, em meio a muitos mitos e bugs. As conquistas científicas da última metade do Século XX sinalizavam a superação de muitos desafios e novidades de tempos melhores à qualidade de vida mundial. As Tecnologias das informações e das comunicações (Tics) patrocinaram nova realidade aos habitantes da terra, com a aproximação, visual e audível, das pessoas distantes, no contexto da desejada globalização.
No Brasil, buscava-se adaptar à realidade vigente, diante das possibilidades do avizinhamento favorável ao desejado desenvolvimento. Na perspectiva brasileira, o reordenamento constitucional fazia-se necessário, em consequência das muitas conquistas almejadas. Promulgada em 5 de outubro de 1988, a sétima e mais palavrosa de todas as constituições passou a viger, iniciando-se a Nova República.
Nos trinta e seis anos de vigência da Constituição Cidadã, assistiu-se ao crescimento do Estado Brasileiro, carente de reformas emergentes, sob a batuta politiqueira e desqualificada. Nos cinco primeiros anos, na era dos planos econômicos, os brasileiros amarguraram, às duras penas, situações inflacionárias jamais vistas. Houve ligeira calmaria, política e econômica, após a renúncia do primeiro presidente eleito pelo povo e a efetividade da nova moeda – o Real – equiparada ao Dólar Americano.
Desde a última década do Século XX e nesses anos do Século XXI, diversas atitudes de governantes da Nova República tornaram-se, publicamente questionáveis, e a multiplicidade de partidos políticos ampliou a corrupção política. Com o surgimento da Lava-Jato, estimava-se a existência de quadrilhas constituídas por políticos brasileiros, na maioria das Unidades da Federação. Ao lado disso, surgia ao redor do mundo o denominado ativismo judiciário, situação desfavorável à sustentação saudável de uma República harmônica e coesa.
Cúmplices e devedores, os membros dos Poderes da República se inquietaram, após um processo de impeachment da Chefe do Executivo e prisões de líderes políticos brasileiros. Renascia a expectativa de fortalecimento do Estado à condição de agente da Sociedade Brasileira. Ampliou-se, ainda mais, após a eleição e constituição de um dos melhores governos da Nova República, em meio à fatídica pandemia mundial.
Vivenciamos, desde janeiro de 2023, situações caóticas, diante de muitas incertezas. Não se vislumbra um cenário crescimento, ao contrário, há possibilidades nada alvissareiras, na perspectiva do Dólar Americano valendo R$5,20. Há insegurança diversificada e muita, muita mentira, propagada nos ares brasileiros.
A sustentação e o endosso das lides judiciais descabidas e nada honrosas
A despeito dos distintos momentos politiqueiros e desqualificados, havia expectativas de tempos melhores e adequadas condições de vida à desejada felicidade das pessoas. Com o tempo, esperava-se – principalmente, dos praticantes da desejável Justiça, qualificados no seu cânon sagrado – a proteção devida. Não foi o que aconteceu naqueles anos setecentistas, no julgamento dos acusados de conspiradores.
De volta aos registros historiográficos citados anteriormente, é oportuno expor, neste 21 de abril de 2024, como foi a sentenciamento daqueles que aspiravam a Liberdade ainda que tardia. Eis os registros do 21 de abril de 1792:
(…)
Todas as sentenças, salvo a do alferes Silva Xavier, foram comutadas em banimento.[3](81). O espetáculo estava quase no fim. Na manhã de 21 de abril de 1792, Tiradentes, escoltado pela cavalaria do vice-rei, foi conduzido a um grande patíbulo nas cercanias da cidade. Aí, ao redor das 11 horas, sob o rigor do sol, com os regimentos formados em triângulo, depois de discursos e aclamações “á nossa augusta, pia e fidelíssima Rainha”, o bode expiatório foi sacrificado.[4](82)
A tranquila dignidade com que Tiradentes enfrentou a morte foi um dos poucos momentos heroicos do fracasso sombrio. Quase um século depois, quando o Brasil implantou a república, ele foi proclamado herói nacional. E esta condição de herói nacional do alferes dos Dragões de Minas não é injustificada: em comparação com o de seus companheiros de conspiração, o comportamento de Tiradentes, ao ser interrogado, foi exemplar, ninguém o sobrepujou em entusiasmo por uma Minas independente, livre e republicana; reclamou para si o maior risco e não há dúvida alguma de que estava disposto a assumi-lo. Conforme dizem ter Cláudio Manuel da Costa afirmado, tomara que existissem mais homens desta têmpera! Tiradentes não era um anjo, nenhum homem o é. Mas, em uma história particularmente carente de grandes homens, Joaquim José da Silva Xavier impõe-se como uma exceção.
Entretanto, os espetáculos não substituem a política: a euforia provocada pela clemência da rainha, agora louca, não podia durar. Os problemas prementes que tinham levado ao confronto a plutocracia de Minas e o governo luso não haviam sido eliminados com o enforcamento de Tiradentes. E nem poderia ser indefinidamente adiado o exame das implicações mais amplas da inconfidência na política colonial portuguesa no Brasil (…) (Maxwell, 1973, p. 304-305).
No período antecedente à eleição de 2022, os brasileiros ficaram estarrecidos com as decisões frequentes da Alta Corte Republicana (ACR). Não se encontrava, até então, qualquer manifestação pública de qualquer um de seus membros. Desde então, as notícias sobre decisões, monocráticas ou não, são faladas e publicadas nas mídias brasileiras.
Quantas e quais são as decisões, justas ou injustas, da ACR?
Liberdade ainda que tradia!
Fonte das citações:
MAXWELL, Kenneth. A Devassa da Devassa – A Inconfidência Mineira – Brasil e Portugal [1750-1808]. Edição Ampliada e Ilustrada.
[1] (56). Mathias, CCANRJ, 25-6.
[2] 57. “Auto de perguntas…Padre José da Silva de Oliveira Rolim”, Vila Rica, 3 de março de 1790, ADIM, II, 473-6; “Auto de perguntas feitas ao Sargento-Mor Alberto da Silva e Oliveira Rolim”, Vila Rica, 20 de fevereiro de 1790, ADIM, II, especialmente 460-1.
[3] (81). A nova sentença foi dada a 20 de abril de 1792, Santos, Inconfidência Mineira, 619; sobre informações relativas ao destino dos banidos para a África, ver Padre Manuel R. Pombo, Inconfidência Mineira: Conspiradores que vieram deportados para os Presídios de Angola em 1792 (Luanda, Angola, 1932); Macedo tinha sido informado particularmente da chegada do navio que levaria vários prisioneiros para o exílio, Capitão Antônio Ribeiro de Avellar a J. Rodrigues de Macedo, 18 de maio de 1792, CCBNRJ, 1-1-17; O vice-rei comunicou ao ministro Melo e Castro três dias depois, Conde de Resende a M. de Melo e Castro, Rio de Janeiro,
20 de maio de 1792, AHU, Minas Gerais, caixa 94; Melo e Castro respondeu em setembro, Melo e Castro ao Conde de Resende, Queluz, 20 de setembro de 1792, AHU, Minas Gerais, caixa 92 (47); O Visconde de Barbacena comunicou a Resende que as determinações da alçada tinham sido cumpridas com exatidão, Visconde de Barbacena ao Conde de Resende, 31 de maio de 1792, IHGB, lata 109, doc. 39.
[4] 82. “Últimos Momentos…”, AMI, II (1953) 240-3. “Ofício do Conde de Resende a Martinho de Melo e Castro. Rio de Janeiro 24 junho 1792” e anexo “Relação dos Presos da Inconfidência que têm sido remetidos para os seus destinos”
1 – Inácio José de Alvarenga – para Ambaca por toda a vida.
2 – Luís Vaz de Toledo Piza – para Cambembe por toda a vida.
3 – José Álvares Maciel – para Massangano por toda a vida.
4 – Francisco Antônio de Oliveira Lopes – para o Bié por toda a vida.
Os 4 acima embarcaram para Angola em 5 de maio de 1792, na corveta Nossa
Senhora de Guadalupe e Nossa Senhora de Brotas.
5 – Tomás Antônio Gonzaga – para Moçambique por 10 anos.
6 – Vicente Vieira da Mota – para Rio de Sena por 10 anos.
7 – José Aires Gomes – para Inhambaré por 8 anos.
8 – João da Costa Rodrigues – para Mossuril por 10 anos.
9 – Antônio de Oliveira Lopes – para Mucuá por 10 anos.
10 – Vitorino Gonçalves Veloso – para Cabeceira Grande por 10 anos.
11 – Salvador Carvalho do Amaral Gurgel – para Catala por toda a vida.
Embarcaram os sete presos que se declaram, para Moçambique, em 22 de maio
de 1792, no navio Nossa Senhora da Conceição – Princesa de Portugal
12 – José Martins Borges – Foi para galés em 16 de maio de 1792.
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13 – José de Resende Costa, pai – para Bissau por toda a vida.
14 – José de Resende Costa, filho – para Cabo Verde por toda a vida.
15 – Domingos Vidal de Barbosa – para a Ilha de Santiago por toda a vida.
16 – João Dias da Mota – para Cachéu por 10 anos.
Embarcaram para Lisboa os 5 presos acima referidos na fragata Golfinho de Sua Majestade, em 24 de junho de 1792. [Os cinco] 5 [eclesiásticos também embarcados na fragata Golfinho .
17 – Domingos de Abreu Vieira – para Muxima por toda a vida.
18 – Francisco de Paula Freire de Andrade, – para Pedra do Encoje por toda a vida. Embarcaram estes dois na corveta Nossa Senhora da Conceição e Santa Rita em 25 de junho de 1792.
19 – Fernando José Ribeiro – para Benguela por 10 anos. Fica na cadeia por faltar
ainda embarcação em que seja transportado.
Autos de Devassa da Inconfidência Mineira (Câmara dos Deputados, Brasília, 10 vols., 1976) vol. 8 (1977) 385-388.
Respostas de 2
Gostei muito de seu Texto Liberdade ainda que Tardia, com boas achegas de alerta contra as maquinações perversas atuais contra nossa preciosíssima Liberdade.
Parabéns! Textos assim consolidam a autenticidade e legitimidade inegociáveis de nosso PontoPM.
O Deportado no 18 de seu rol de fechamento do Texto é Francisco de Paula Freire de Andrade, e não de Andrada, de acordo com registros históricos inatacáveis de Leozítor Floro, in A Polícia Militar através dos Tempos(vol.1)…,/Centro de Pesquisa e Pós-Graduação da PMMG, 2012.
Nota: O ilustre n° 18 é o Primeiro Comandante-Geral de nossa Corporação, de 1775 a 1789, como primeiro Comandante do Regimento Regular de Cavalaria da Capitania Real das Minas do Ouro: a primeira (a mais antiga) Força Pública do Mundo.
Agradeço seu comentário, Estimado Amigo, companheiro de muitas jornadas e Confrade-Presidente Mesa-Marianianas, João Bosco de Castro.
Nosso muito obrigado, pelas suas lições historiográficas de Nossa — quase Bicentenária e Meia — Polícia Militar de Minas Gerais. Nelas, fontes de saberes PM, notáveis Militares Mineiros e de outras Unidades da Federação beberam límpidas águas!