No momento recente da história vimos acontecer duas grandes catástrofes que demonstram claramente o uso do poder econômico para o soerguimento de um povo. Uma catástrofe refere-se ao cataclismo devastador sobre um país na costa africana e a outra sobre um monumento icônico da sociedade urbana europeia reportado em muitas imagens; produções artísticas; movimentos sociais, políticos, econômicos e das ordens – militares, religiosas e filosóficas.
Tanto numa como na outra, os recursos financeiros são essenciais para o restabelecimento das memórias perdidas, quer seja em Moçambique, quer seja em Notre-Dame, o conjunto de memórias inertes, latentes e afloradas determinam esforços incomuns para o soerguimento material e imaterial.
Mas por que Notre-Dame inflama os donos do dinheiro na mobilização para o soerguimento material e imaterial e o mesmo não acontece com Moçambique?
A resposta pode ser compreendida a partir da obra de Adam Smith, o pai da economia moderna, em essência a riqueza das nações é a capacidade da moeda se transformar em moeda e a distribuição da riqueza ser consequência do processo produtivo e não apenas da distribuição em função de programas sociais.
Os donos do dinheiro sabem que em Notre-Dame a moeda vai se transformar em moeda, ou seja, em Notre-Dame a moeda vai construir hipóteses para agregar valor ao Conhecimento, ao turismo, à vontade de crescer das artes e ciências manifesta pela capacidade de transformar do homem, que aliado aos recursos tecnológicos
disponíveis transformará em esforços para restabelecer as memórias materiais e imateriais perdidas no incêndio.
E por que isso não acontece em Moçambique? Simplesmente pelo fato de Moçambique ser um país fornecedor de matéria prima, um país que não gera Conhecimento, um país cujo capital intelectual e valor agregado do povo se aproxima das sociedades coletoras, um típico país onde a remessa de recursos financeiros desestruturados levariam a cooptação do homem, a sua subordinação ao Estado, a sua miséria determinada pelo assistencialismo, ou seja, em nada haveria transformação da moeda.
Os órgãos transnacionais criados a partir da ONU já fizeram a sua parte e as evidências demonstram exatamente o que foi escrito no parágrafo anterior, que em suma diz: o problema da miséria não é a falta de recursos financeiros é o mal emprego e o desvio desses recursos para atender aos donos do poder nesses países. Exemplo claro e recente é a criação do Sudão do Sul, um novo país, com reservas expressivas de petróleo onde grupos guerreiam entre si pelo poder e a população morre de fome.
Para os brasileiros com mais de 50 anos, temos os casos da seca no nordeste, onde as populações do centro-sul se mobilizavam para enviar recursos para o nordeste. O que os órgãos de inteligência apuraram? Os produtos, já no nordeste do Brasil, eram desviados e vendidos em armazéns e boutiques e o resto inservível era distribuído aos reais necessitados. Fazendo crer ao povo nordestino que a população do centro-sul só lhe mandava restos.
Houve, inclusive, uma grande rede de televisão que fazia um programa voltado ao assistencialismo de crianças e captava recursos via telefone, ao final doava esses recursos ao UNICEF e lançava como doação própria dela, em clara fraude ao fisco brasileiro.
Os dois exemplos estão dentro do Brasil e falam exatamente da captação de recursos com origens em pessoas físicas e em ambos revela-se o caráter ausente de princípios, valores e virtudes. É justamente isso que não mobiliza a opinião pública para o problema de Moçambique e que, ao contrário, mobiliza no caso de Notre-Dame de Paris, pois em Notre-Dame de Paris há a crença no correto emprego dos recursos financeiros, coisa impossível de se auditar num Governo.
Apenas para reforçar essa reflexão, pergunto a você leitor: na hipótese de se aplicar o seu 13º salário, com o objetivo de comprar um bem, postergando o seu consumo, você o faria num banco que ao final proporcionasse uma remuneração do seu capital em 10% do lucro líquido originário das visitas à nova Notre-Dame de Paris ou o faria num banco que a remuneração fosse compatível com a produção agrícola de Moçambique?
Não é preciso responder.
Respostas de 4
São aspectos que não analisamos nessa vida corrida nossa! Tudo é interesse neste nosso mundo! O homem realmente é uma praga de si mesmo! E de outras especies tb! Deixamos de valorizar com igualdade as diversas obras e nichos ecologicos em nosso planta. Parabéns meu caro escritor!
Meu Caro Mateus Queiroz Corrêa, o homem tende a maximizar os seus objetivos, mesmo que a maximização seja o infortúnio dos outros. Obrigado por partilhar conosco o espaço virtual Pontopm.
Concordo sobre a diferença em se colaborar com a reconstrução de Notre Dame ou Moçambique considerando a questão do “retorno financeiro”. Por outro lado há outros ingredientes sobre uma ajuda à Moçambique, pois é muito clara a possibilidade do dinheiro ser desviado, não sendo efetivo na ajuda. Algo muito semelhante acontece no nordeste brasileiro. Na França os mecanismos de controle tendem a ser mais eficientes.
Outro ingrediente interessante na diferença numa escolha de ajuda financeira é a ostentação na mídia; tão em moda atualmente.
O paralelo sobre aplicar meu 13°, creio que não está coerente. Se trata de salário, diferente de uma contribuição de um milionário escolhendo ajudar Notre Dame ou Moçambique. Necessito dele e se aplico é para fazer face à uma necessidade.
Se o paralelo da aplicação do salário fosse em bancos com mesmo rendimento, em que um contribuiria com Moçambique e outro não, seria mais equilibrado.
Meu amigo Roberto Sá, muito obrigado pela sua assiduidade ao nosso espaço virtual Pontopm, a questão da aplicação financeira é na verdade uma figura de linguagem que nos remete ao termo “compliance” instrumento de controle essencial em qualquer projeto. Creio que as pessoas normais e que não demandam ostentação procuram ajudar através dos programas dos Médicos Sem Fronteiras, Cáritas, dentre outros. Até o próximo texto.